Saturday, November 08, 2008



Mélanie Pain



Nouvelle Vague e Nadeah Miranda


Nouvelle Vague e Mélanie Pain



Nouvelle Vague

É uma fórmula engenhosa aquela a que Marc Collin, mentor dos Nouvelle Vague, deitou mão. Ele garante que o sucesso do primeiro disco o apanhou de surpresa e nada teve de premeditado, mas se tivesse feito de propósito, talvez não lhe saísse tão bem. Nos Nouvelle Vague, dois discos em carteira e um terceiro na calha, Collin encontrou um veículo de regurgitar canções conhecidas de toda uma geração - a que agora tem entre 20 e picos e 40 anos - num formato acessível e confortável. Êxitos do punk, da new wave e do indie oitentista voltam à ribalta e aos palcos não através do enésimo regresso de banda veterana, mas na forma de versões acetinadas, sensuais e invariavelmente femininas. É assim que "One Hundred Years", o portento suicida dos Cure (elogio!) que abriu o concerto de ontem, no Campo Pequeno, se transforma numa canção de charme vaporosa, na voz da irrequieta Nadeah Miranda, ou que "Bizarre Love Triangle", dos New Order, perde em fulgor pop o que ganha em ponderação de bossa nova.

A fórmula, dizíamos nós, é vencedora e bate a todas as portas daquilo que é, em teoria, o gosto adulto médio: música popular brasileira, pop vagamente jazzy, lounge, dub e reggae em lume brando. Em palco, os Nouvelle Vague vivem muito da presença das suas cantoras; depois da partida, mais ou menos definitiva, de Camille, Martina Celeste e Phoebe Killdeer, todas lançadas em carreiras a solo, Marc Collin recrutou a loura Nadeah Miranda, que ontem maravilhou o público com um vestido curtíssimo e algumas incursões espontâneas pela plateia, e a morena Marianne Elise, mais elogiada pela simpatia "latina" e pelas formas curvilíneas.

Se as suas vozes pouco vão além da competência, Nadeah Miranda e Marianne convenceram pela forma como comunicaram com o público ao longo de duas horas e meia de concerto; em "Dancing With Myself" puseram toda a gente a estalar os dedos, com "Fallen In Love With Someone" apelaram à dança, e em "Blue Monday" fizeram sonhar com cocktails que o bar da Praça de Touros não servia (mas fumar fumou-se livremente, e não só tabaco). No entanto, o ponto de viragem do espectáculo terá chegado com "Too Drunk To Fuck": a loucura de Nadeah Miranda, que depois de tanto provocar os espectadores acabou por desaparecer na plateia durante alguns minutos, pôs toda a gente a entoar o refrão da música dos Dead Kennedys, num dos momentos mais acalorados da noite. Curiosamente, os ânimos acalmaram-se logo de seguida com Mélanie Pain, a menina que assegurara a primeira parte do concerto, a tomar conta de "God Save The Queen", dos Sex Pistols, como quem vela pelo sono de um bebé. Angelical no seu vestido branco de "fille française", a cantora convenceu o Campo Pequeno a cantar em coro o verso "no future" ("é aquela cena dos punks", explicava a nosso lado um espectador aos amigos).

Na recta final do espectáculo, que se prolongou durante vários encores, o maior protagonista acabou por ser o guitarrista e vocalista Gérald Toto, que emprestou um toque ligeiramente tribal a "Heart of Glass" e "Sweet Dreams", com uma conclusão festiva a fazer lembrar os Gogol Bordello, e desacelerou até ao absurdo, na última música da noite, "Relax", dos Frankie Goes To Hollywood. Tanto em palco como entre o público, no entanto, a noite às senhoras pertenceu e na memória é mais provável que sobrevivam a prestação naïf de Mélanie Pain em "Teenage Kicks", "Love Will Tear Us Apart" e "In A Manner of Speaking", ou os espasmos vampirescos de Nadeah Miranda no cabaré negro de "Bela Lugosi Is Dead". Emocionados com a resposta do público a um concerto que garantem ter sido "muito especial", os Nouvelle Vague despediram-se com um convite: no próximo dia 17 de Novembro, o outro projecto de Marc Collin, chamado Hollywood Mon Amour, dá um concerto grátis no Casino de Lisboa, anunciou Nadeah. Pela ovação com que a notícia foi recebida, não faltarão espectadores no regresso de Collin a Portugal, dessa feita para reinventar canções de filmes dos anos 80. Na primeira parte do concerto de ontem, Mélanie Pain mostrou que podia ser a quarta voz das Au Revoir Simone, trio feminino de Nova Iorque que, tal como a francesa, aposta tudo na delicadeza de voz e teclados. Com canções em inglês e francês, Mélanie conquistou adeptos e deixou-nos a pensar qual será o superlativo de "coquete". Com os seus modos de princesa e voz sussurrada, é difícil imaginá-la a viver fora de uma caixinha de música.

Texto de Lia Pereira Fotos de: Rita Carmo/Espanta Espíritos in Blitz