Tuesday, May 19, 2009

no dia em que morri

no dia em que eu morri
ninguém percebeu.
nem os que vivem à minha volta.
não estava doente
mas deveriam saber reconhecer um corpo inerte, um cadáver.
talvez não conseguissem - nenhum deles - ver além da forma imediata da matéria.
nem ver a ausência de luz por trás dos olhos.
ou o frio das mãos. as pontas dos dedos roxas.
mas principalmente,
a ausência progressiva do coração que se foi aos poucos, desfazendo se até que apenas o seu eco batia no meu peito.
o eco.
e assim,
dia após dia,
desde aquele dia,
todos me olham, tocam e falam
como se eu ainda fosse parte do grupo,
ainda estivesse viva.
mas sabem,
vou vos contar um segredo...
só eu e os bichinhos,
aqueles da madeira,
sabem que morri.
que me desintegrei em pedaços
disparados em milhões de direcções
e não segurei firme nenhuma mão
porque nenhuma me foi oferecida.
vivi muitos sonhos falsos
e sentei me em demasiados lugares ocupados
para no fim encontrar
apenas a ridícula solidão.
mas tu também saberias que morri se acaso me visses.
ou não...
se os teus olhos não estiverem já perdidos a espreitar horizontes longínquos.


42 comments:

Eu Mesma! said...

bom dia linda!

S* said...

Hum... Um texto que implica bastante reflexao. Por vezes nao nos apercebemos com as pessoas que estao mesmo ao nosso lado...

Tisha said...

As pessoas andam sempre demasiado ocupadas a olhar para o seu umbigo, para os seus problemas (que parecem sempre muito maiores que os dos outros), para o trabalho que não acaba... enfim! Demasiado ocupadas para perceber e quando percebem às vezes é tarde demais :(

Eu também morri... e ninguém percebeu!

* said...

Muitas vezes somos demasiado cegos ao que nos rodeia...E com isso perdemos muito de nós e dos outros.
Beijo Velinha

Vício said...

Tens sempre uma mão estendida para te ajudar. Basta quereres!
Sabes onde ela está? Ao fundo do teu braço...
Essa é a única em que podes confiar...

Bruxinha said...

Concordo ;)
Tantas vezes absorvidos por mil e uma coisa nem percebemos como existem pessoas á nossa volta que morrem :(

Jinhos

Anonymous said...

O Livro dos Dias
Renato Russo


Ausente o encanto antes cultivado
Percebo o mecanismo indiferente
Que teima em resgatar sem confiança
A essência do delito então sagrado
Meu coração não quer deixar
Meu corpo descansar
E teu desejo inverso é velho amigo
Já que o tenho sempre a meu lado
Hoje estão aceitas pelo nome
O que perfeito entregas mas é tarde
Só daria certo aos dois que tentam
Se ainda embriagado pela fome
Exatos teu perdão e tua idade
O indulto a ti tomasse como bênção
Não esconda tristeza de mim
Todos se afastam quando o mundo está errado
Quando o que temos é um catálogo de erros
Quando precisamos de carinho
Força e cuidado
Este é o livro das flores
Este é o livro do destino
Este é o livro de nossos dias
Este é o dia de nossos amores


Abrs.

Marta Silvestre said...

Vemos pouco com o coração..

se tivesses ganho o euromilhões talvez percebessem com mais facilidade.
Enfim...Prioridades Estupidas*

Beijinhooo*

Abobrinha said...

Velas e Tisha

O bom que tem estas mortes é que se pode renascer. Que se deve renascer. Deve lutar-se por renascer... todos os dias, bocadinho a bocadinho. Lutar por sorrir. E recupera-se aos poucos o calor até este ser claro e intenso.

joão said...

muito bom texto.

Zezé said...

o teu blog está no top ten de tudo que eu ja li :)

Unknown said...

Habituámo-nos a olhar não a ver...
um abraço
Tulipa

Su said...

....
vivi muitos sonhos falsos
e sentei me em demasiados lugares ocupados
.....


pois


jocas maradas de sentires

izzie said...

Acontece demasiadas vezes, infelizmente...

Beijinho,

Noiva Judia said...

Habituamos-nos a ter a presença das pessoas à nossa volta e nem nos damos ao trabalho de ver se elas estão mesmo ali...

Tens um miminho no meu blog.

Teresa Santos said...

É sempre tão bom ler o que escreves!

Mas sei que tens (terás) sempre uma mão à tua espera.

Bj e dorme bem

notyet said...

É. Os humanos não dão por essas coisas de vida e morte.
Andam demasiado atarefados
Tens de falar com outros animais.
A foto é explendida.
Um gélido beijo

O outro lado do espelho said...

Eu que morri e ressuscito aos poucos, revejo-me nas tuas palavras.
Um beijo

A menina do bairro said...

passei aqui para dar um beijinho!
e obg pela saudade foi ela que me vez escrever!

Maria said...

Todos nós temos uma altura em que morremos. Depois voltamos a nascer. Já morri algumas vezes, renasço sempre...
Adorei o teu texto!

Beijos

Chinezzinha said...

Agora e depois de ler isto, sabes o que sinto?
Uma vontade muito grande de ser tua amiga real e dar-te um enorme abraço. Sei que isso nunca acontecerá mas sinto isto, neste preciso momento.
Um beijinho
Ana

Carracinha Linda! said...

Querida Velinhas...

Realmente às vezes andamos tão ocupados com as nossas vidas que nem prestamos a devida atenção a quem e ao que nos rodeia.

Felizmente, existe sempre alguém verdadeiro nas nossas vidas, um amigo genuíno, que até pode não estar ao pé de nós, mas está sempre do nosso lado, disposto a ouvir-nos, a estender uma mão e a oferecer-nos o seu ombro.

Para o que for preciso, eu estou aqui para te oferecer isso!

Beijinhos

... said...

Em duas palavras que escreveste se podia resumir este texto: "Ridícula solidão".

Walter said...

A expressão horizonte longínquo é de facto a chave para este poema...é essa fixação no que está longe/futuro que nos cega e impede de ver o que passa mesmo ao nosso lado.
ADOREI
bj
walter

Seastar_ Hannanur said...

OMG!

Que título mais sinistro!

Mas tu ainda estás amargurada?

este texto lembra-me qualquer coisa...

Vá,Velinhas, levanta a cabecita e sorri!

Abracinho!

Teresa Durães said...

quando explodidos em milhões de partículas passamos a ser parte integrante do universo

By Me said...

VELAS HÁ MUITAS FORMAS DE SE MORRER... INFELIZMENTE AQUELES QUE NOS SÃO MAIS PRÓXIMOS ESTÃO DEMASIADO OCUPADOS ...
AS PESSOAS NÃO RECONHECEM...E NÃO VALE A PENA DEIXAR-SE MORRER PARA QUE NOS VEJAM...
E NÃO PENSES QUE ÉS A ÚNICA QUE NÃO TEVE UMA MÃO A QUE SE AGARRAR...QUE VIVEU SONHOS FALSOS,
QUE OCUPOU LUGARES PREENCHIDOS...
SABES VELAS EU RECONHECIA-TE PORQUE TAMBÉM EU JÁ MORRI E RENASCI DAS CINZAS...

ABRAÇO SENTIDO

Maria said...

Já morri mais do que éne vezes.

mfc said...

Mas estamos vivos... e é isso que importa!

(Aquela foto é de Chennonceaux... um Castelo do Vale do Loire, construído sobre um seu afluente La Chère no centro de França.)

ricardo said...

*

nOgS said...

É tão forte e belo, triste este texto.

Beijinho

Clotilde S. said...

Belo texto. Palavras de grande sabedoria.

Deixei uma gracinha no Chá de Rosas.

Beijinho :)))

poca said...

bem.. este é daqueles que bate cá dentro. podia fazer parte de um qualquer livro que enfeitam as melhores prateleiras...

mas sabes... o vício, que tantas vezes parece insensível ou desapegado, desta vez acertou. Tens-te a ti! Tenho pensado muito nisso ultimamente. Que no essencial podemos contar sempre connosco. E só.
E sei que ninguém queria. E que alguns fingem que não o é. E que há uns que têm mais sorte do que outros. Pelo menos aparentemente. Porque se calhar. Só têm um medo maior de estar sós. E uma maior resistência maior ao tal "acomodar". Ou então não. Somos nós que queremos demais. Que acreditamos que há mais...
Não sei.

alma said...

morremos para voltar a nascer
se procuramos bem encontramos uma mão para agarrar, alguém a quem
pedir um abraço,
que às vezes pode nos salvar
naquele momento
eu sei porque já tive um abraço assim
salvou-me e hoje considero
minha grande amiga
e sei que lhe posso sempre
pedir aquele abraço
...e apetece tantas vezes pedir-lhe

beijo

Dark-me said...

Comoventes estas tuas palavras.
Talvez não tenhas morrido...talvez tenhas apenas adormecido...

...E o q ñ nos mata, torna-nos mais fortes!

Dark kiss

Anonymous said...

Passei só para te deixar um beijinho :)

Mafalda Gomes said...

O texto é muito bom :)

sakurach4n

Boo said...

Andei às lutas com o meu Blog que, para mim, dá sempre erro, por isso decidi mudar de poiso! Cansei!! Agora estou aqui: http://boo-caminhandonaterra.blogspot.com/

Beijos

Porcelain said...

Também já morri... e também ninguém deu por isso... ainda bem... ou talvez não.

Por um lado é bom... pode-se morrer e renascer sem sofrer cobranças, pedidos de explicaçõoes que não sabemos dar... por outro é solitário... mas eu gosto de estar só. :)

Beijinhos!

she. said...

Só morremos quando somos esquecidas?
Achas que isso algumas vez acontecerá por completo?
(sinceramente, às vezes tenho medo que sim mas shhhhhh, é segredo!)

AC said...

Acredito que existe Vida, percebo-a flashada aqui e ali, mas não como entidade constante, porque na essencia fizeram-nos mortos.

Fica...

ruth ministro said...

Gostei tanto deste teu poema... Conseguiste transmitir-me uma tristeza tão assimilada, tão aceite, que parece já nem doer... Muito bonito.

Beijinhos